#19 Fósseis de Galar: expectativas e realidade


 Expectativas sobre os novos Pokémon sempre acontecem quando um anúncio é feito. Muitos fãs foram as redes sociais debater o futuro dos iniciais lançados no começo do ano passado, e ao longo do ano eu me deparei com várias discussões sobre como seriam certos tipos de Pokémon em Pokémon Sword e Pokémon Shield (2019). Sem falar nos inicias, toda a geração tem lendários novos, que são antecipados não só por serem legais, mas porque serão parte da mitologia do novo território a ser explorado. Outras categorias, como o tipo Voador e o tipo Normal das primeiras rotas, ou as possíveis novas eeveelutions também recebem bastante atenção pela internet, em locais especializados ou até pelo público em geral. Parece que depois de Pokémon Sun e Pokémon Moon (2016) também podemos ficar ansiosos pelas novas formas regionais a serem introduzidas a cada nova geração, e existiu muito burburinho sobre quais espécies antigas seriam alteradas pelos condicionantes de uma região baseada no Reino Unido.
 Porém, uma das categorias ou grupos que mais me chamou a atenção é a de Pokémon fósseis. Se em Alola não houve nenhuma adição pela dificuldade de se encontrar fósseis em rochas vulcânicas no mundo real (como as que ocorrem no Havaí), em Pokémon Sword e Pokémon Shield tivemos muitas surpresas. Depois de digerir os novos Fossil Pokémon, eu não soube nem onde enfiar as minhas expectativas.

 Primeiro, porque os fósseis da região de Galar são muito diferentes do que normalmente acontece.
 Além de serem quatro Pokémon sem ligação evolutiva (pulando o padrão de são duas linhagens com dois estágios evolutivos) e não possuírem o tipo Rocha, eles são feitos por metades de fósseis diferentes. Cara Liss, a cientista que os recupera na Rota 6, utiliza de uma pequena variedade de duas metades inferiores e duas metades superiores para formar criaturas que mais parecem experimentos de laboratório do que réplicas de animais extintos.
 As combinações entre Fossilized Bird, Drake, Fish e Dino resultam em "frankensteins" Pokémon: Dracozolt é uma mistura da metade superior de dinossauro muito parecido com uma ave e dos membros inferiores de um estegossaurídeo; Dracovish chega a ser ainda mais esquisito, pois a cabeça que parece muito um Dunkleosteus, gênero de peixes que vivia no Devoniano (há mais de 360 milhões de ano), fica agora ligada a cauda do estegossaurídeo; Arctovish tem a cabeça de Dunkleosteus colocada ao contrário no corpo de algum réptil aquático não identificado (pois não temos nada acima das costelas para entender a origem da criatura); e Arctozolt tem a mesma cabeça de dinossauro (semi) aviano agora presa no corpo não identificado. As peças desse quebra cabeça estão tão embaralhadas que até a imagem dos itens Fossilized Drake e Fossilized Fish parecem estar invertidas dentro dos jogos.

 Segundo, porque os fósseis são surpreendentemente fortes em situações específicas.
 Todos esses monstrinhos compartilham características repetidas do grupo de fósseis base que vão além do design. Os tipos são o melhor exemplo, já que quem possui a metade Bird tem o tipo Elétrico; quem tem a cabeça do Fish é tipo Água; quem está preso no corpo do Dino é tipo Gelo; e quem tem as pernas do Drake é tipo Dragão. Além disso, eles aprendem dois movimentos muito similares chamados Bolt Beak (Elétrico) e Fishious Rend (Água), sendo a distribuição de acordo com a metade superior de cada um. Com 85 de poder normalmente, os movimentos dobram de força ao atingirem o adversário primeiro, o que tornou Dracozolt e Dracovish (aqueles que possuem as melhores velocidades) muito aterrorizantes se colocados junto de alguma forma de controle de velocidade (como Tailwind ou Max Airstream). Somados a isso existem os bônus de Hustle e Strong Jaw, respectivamente, que dão uma forcinha a mais aos outros movimentos do tipo físico. Isso não muito comum de acontecer com os outros monstrinhos fósseis, tirando o ponto fora da curva que foi o Mega Aerodactyl. Geralmente existe um grande problema de velocidade irremediável ou fraqueza por causa das desvantagens do tipo Rocha que impedem o uso indiscriminado deles.
 Mesmo Arctozolt e Arctovish ficando para trás, todos eles são passíveis de serem utilizados em equipes de Sand ou Hail quando tiverem suas Hidden Abilities liberadas. Recebendo Sand Rush ou Slush Rush (agora de acordo com a metade inferior de cada um), habilidades que dobram a velocidade dependendo do clima, o uso de Bolt Beak e Fishious Rend se torna ainda mais letal. Posso atestar pessoalmente que usá-los em batalhas, apesar de precisar de um pouco de planejamento, leva a casos muito interessantes de finalizar os oponentes com um ataque só. Eu espero principalmente pela liberação de Arctozolt com Slush Rush para poder testar o poder de uma equipe de Hail com um movimento tão forte assim.

 Terceiro, porque eles representam a forma como o imaginário popular interpretou as primeiras descobertas da Paleontologia de Vertebrados no Reino Unido.
 Parece esquisito pensar nisso, mas, quando os primeiros vertebrados fósseis foram estudados por anatomistas e paleontólogos britânicos (mais sobre isso em: #08 Cavando em busca dos fósseis de Galar!), não existia um modelo pronto de como animais extintos deveriam ter se parecido quando em vida. Foi só depois do desenvolvimento do estudo sobre Evolução e muito teste de hipóteses que se chegou as reconstruções atuais de como dinossauros e outros vertebrados poderiam se parecer em vida. Essas reconstituições ou reconstruções feitas por paleoartistas hoje são fruto de bastante estudo inclusive, sendo constantemente repensadas se surgirem novas evidências que indiquem uma ideia diferente. Historicamente, elas também foram muito importante para comunicar ao público o que estava sendo estudado pelos cientistas. Uma exposição de reconstruções antigas pode inclusive ser a inspiração do quebra-cabeça que é a reconstituição de fósseis galariana: o Crystal Palace foi inaugurada em Londres no ano de 1853, e contava com reconstituições em forma de estátuas de muitos seres extintos para a observação do público. Erros grosseiros podem ser encontrados se comparados ao que sabemos hoje, como a presença de criaturas marinhas fora da água ou a forma de lagartos gigantes que os dinossauros apresentam. Entretanto, até hoje existe um fascínio muito grande do público em geral com a forma que esses animais se pareciam em vida, seus comportamentos sociais e fisiológicas. É só procurar o tanto de debates que existem sobre uma certa franquia famosa de filmes sobre dinossauros em parques.
 Além de serem baseados nos animais do Crystal Palace, as descrições da pokédex de Dracozolt, Dracovish, Arctozolt e Arctovish também lembram muito uma corrente de pensamento da época em que se começou a discutir esses animais extintos. Antigamente, imaginava-se que essas grandes criaturas pereceram pela sua incapacidade de viver no ambiente ou de se manter como os outros animais da época, por pura falta de aptidão. Isso se conecta muito com as hipóteses de extinção da trupe marota que temos agora: ou eles sofreram com a sua falta de capacidade de se adaptar a falta de alimento provocada por mudanças ambientais (Dracozolt e Dracovish, apesar do último ser o motivo da escassez); ou chegaram a extinção por inadequações anatômicas e fisiológicas (Dracovish, Arctozolt e Arctovish). De qualquer forma, é bem cativante perceber a bagagem cultural que esses Pokémon carregam do pensamento histórico popular.

 Em conclusão, os Pokémon fósseis são bem surpreendentes e de fato eu não conseguiria ter imaginado algo parecido antes do lançamento dos jogos. Seja pela quebra no padrão de fósseis das outras gerações, pelo surpreendente e até letal funcionamento em batalhas (o que não é muito comum para essa categoria de monstrinhos) ou pelas origens não-ortodoxas, os quatros Pokémon apresentam uma profunda linha de pensamento por trás, que contrasta com a impressão inicial dos designs aleatórios. Se foi um experimento que levou ao engano ou não, os resultados parecem estar funcionando.


Bibliografia utilizada:
https://www.nhm.ac.uk/discover/whats-wrong-with-these-dinosaur-reconstructions.html
https://www.discovermagazine.com/planet-earth/when-dinosaurs-went-bad
https://www.atlasobscura.com/places/crystal-palace-dinosaurs
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Cara_Liss
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Fossil#Generation_VIII
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Dracozolt
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Dracovish
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Arctozolt
https://bulbapedia.bulbagarden.net/wiki/Arctovish

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